De acordo com especialistas ouvidos pelo g1, para manter sua posição de neutralidade nos conflitos globais, o Brasil deve contrapor posição dos países mais fortes do Brics, como China e Rússia.
O Brasil sedia, neste domingo (6) e segunda-feira (7), no Rio de Janeiro, a cúpula do Brics — grupo de países emergentes que vive hoje um de seus momentos mais delicados, com guerras em curso, disputas comerciais e novos integrantes com agendas fortes.
Um dos desafios do Brasil é evitar uma guinada anti-Ocidente no grupo, de acordo com especialistas ouvidos pelo g1.
Criado em 2009 por Brasil, Rússia, Índia e China — e ampliado com a entrada da África do Sul em 2010 — o Brics agora conta também com Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egito, Etiópia e Irã.
A ampliação fortalece o peso geopolítico do grupo, mas acentua suas tensões internas. O encontro ocorre dias após o maior bombardeio russo contra a Ucrânia desde o início da guerra e em meio à escalada das tensões entre Irã e Israel, que trocaram ataques diretos em abril.
O Irã, agora membro formal do BRICS, adota postura crítica aos países ocidentais e pressiona por um alinhamento do grupo em fóruns multilaterais. “O desafio atual é garantir que o Brics não se transforme apenas em instrumento de poder dos mais fortes”, diz Laerte Apolinário, professor de Relações Internacionais da PUC-SP.
“O bloco deve continuar buscando reformas na governança global que favoreçam os países em desenvolvimento.” Rússia faz maior bombardeio à Ucrânia desde o início da guerra, um dia após Trump ligar para Putin Neutralidade brasileira sob teste Historicamente, o Brasil adota uma postura de neutralidade ativa em conflitos internacionais e prioriza o multilateralismo.
Especialistas afirmam que esse perfil será colocado à prova na tentativa de mediar interesses tão diversos dentro do BRICS. “Mesmo durante a ditadura, o Brasil manteve relações com Rússia e China.
Mais do que rotular o país como antiocidental, é preciso observar que, no plano doméstico, o Brasil sempre esteve mais próximo do Ocidente”, diz Evandro Carvalho, professor da FGV. Segundo ele, o atual momento exige do Brasil habilidade para dialogar com democracias e também com governos autoritários como os de Rússia, China e Irã. Brics: os desafios do Brasil em uma cúpula com mais integrantes e interesses geopolíticos bem diferentes Jornal Nacional/ Reprodução Expansão do Brics e os riscos A entrada dos novos membros é vista com ambivalência: amplia a influência global do grupo, mas também carrega o risco de que países usem o bloco apenas para fins estratégicos. “A expansão é positiva para dar mais representatividade ao Sul Global, mas também pode atrair países que buscam apenas benefícios estratégicos, sem compromisso com a cooperação”, alerta Cristina Pecequilo, professora da Unifesp. Especialistas comparam o cenário à Hungria na União Europeia, que mantém posturas desalinhadas com os valores centrais do bloco. Moeda comum e tensão com os EUA Outro ponto sensível na pauta é a proposta de uma moeda comum entre os países do BRICS para transações comerciais.
A ideia, capitaneada pela China, visa reduzir a dependência do dólar — o que pode ampliar ainda mais o atrito com os Estados Unidos. “É um movimento estratégico, e tende a crescer com as recentes tensões tarifárias entre países do BRICS e os EUA”, avalia Rodrigo Amaral, professor da PUC-SP.
“Ainda está em estágio inicial, mas é uma sinalização forte.” O papel do Brasil A expectativa de analistas é que o Brasil assuma o papel de mediador, mantendo sua tradição diplomática de moderação e equilíbrio.
Mesmo diante de conflitos e interesses opostos, o país deve reafirmar sua defesa do multilateralismo e do desenvolvimento sustentável. “Este é o momento de o Brasil se posicionar com firmeza, sem radicalizar, mantendo a tradição de diálogo e pragmatismo na política externa”, afirma Carvalho.